Neste Dia da Amazônia, a reflexão que fica é se ainda há motivos para celebrar. O Acre, assim como outros estados da Amazônia, enfrenta desafios sem precedentes causados pelas mudanças climáticas e pela degradação ambiental. O que antes era celebrado como o pulmão do mundo, hoje se encontra em um estado crítico, onde a floresta, os rios, a fauna e a própria população sofrem as consequências de ações devastadoras.
O estado vive uma série de crises simultâneas: enchentes, secas severas, desmatamento e queimadas crescente e uma qualidade do ar em níveis alarmantes de poluição.
Da cheia histórica à seca extrema
Este ano, o Rio Acre, que banha a capital Rio Branco, exemplificou os extremos climáticos. Em um intervalo de menos de dois meses, o manancial passou de uma enchente devastadora para uma seca histórica.
Em março de 2024, o rio alcançou a segunda maior cota de sua história, de 17,55 metros, atingindo mais de 70 mil pessoas. Em maio, ele já estava com pouco mais de 2 metros e em setembro, o nível do rio caiu para 1,30 metro, o segundo menor registro em mais de 50 anos.
Apenas cinco centímetros separam o Rio Acre de alcançar o recorde negativo de menor nível histórico, registrado em 2022.
E a situação de seca extrema não atinge só a capital do estado. O Acre vive as condição mais severa de estiagem desde novembro de 2022. Dados do Monitor de Secas, divulgado pela Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA), mostram que o estado está há três meses consecutivos com 100% do seu território afetado pelo fenômeno.
A seca, que ameaça o abastecimento de água, levou o estado a declarar situação de emergência no final de julho.
Ausência de chuvas
O Acre tem registrado índices pluviométricos extremamente baixos em 2024, intensificando os efeitos da seca. Desde maio, Rio Branco experimenta chuvas muito abaixo da média.
Em junho, o acumulado não passou de 21,1 milímetros, apenas 34% do total esperado para o mês. Julho foi marcado por total ausência de precipitação, o que agravou a situação de seca. Agosto também não trouxe alívio, com apenas uma precipitação significativa no dia 9, que somou pouco mais de 1 milímetro.
Queimadas e qualidade do ar
Com a seca e a falta de chuvas, as queimadas no Acre atingiram níveis preocupantes. Em agosto de 2024, o estado registrou quase 2 mil focos de queimadas, um aumento de 44% em relação ao mesmo período de 2023.
No acumulado do ano, os focos de incêndio já ultrapassam 2.700, mais do que o dobro do registrado no ano anterior.
O aumento das queimadas tem contribuído diretamente para a degradação da qualidade do ar em Rio Branco e em outras cidades do estado.
Os níveis de poluição atmosférica têm alcançado patamares alarmantes. Nos últimos dias, Rio Branco foi considerada uma das cidades mais poluídas do Brasil, ficando atrás apenas de Porto Velho, em Rondônia.
Para se ter uma ideia, a Organização Mundial da Saúde (OMS) considera que o nível aceitável de partículas em suspensão no ar é de até 15 µg/m³ em 24 horas, enquanto Rio Branco registrou 337 µg/m³ na última segunda-feira, 2. Esses níveis afetam não apenas grupos de risco, como crianças e idosos, mas também a população em geral, podendo provocar problemas respiratórios graves.
Baixa umidade do ar e as ondas de calor
Outro agravante da situação no Acre é a baixa umidade do ar, que vem caindo a níveis preocupantes. O estado registrou um índice de apenas 20% em agosto, a menor marca já registrada.
Essa baixa umidade, combinada com temperaturas elevadas, agrava a sensação de desconforto térmico e aumenta o risco de incêndios florestais. O Inmet tem emitido alertas praticamente diários sobre o perigo de incêndios e os riscos à saúde da população, já que a umidade abaixo de 30%, registra nos últimos dias em várias cidades do Acre, é considerada crítica para o bem-estar.
As ondas de calor também têm batido recordes. Rio Branco alcançou temperaturas de 37,1ºC, a maior do ano até agora, e está entre as capitais brasileiras mais afetadas pelo calor.
Desmatamento e destruição de áreas de conservação
Outro fator preocupante é o avanço do desmatamento no Acre. O estado é destaque negativo no ranking de destruição de áreas de conservação na Amazônia Legal, com seis unidades entre as dez mais afetadas.
A Reserva Extrativista Chico Mendes lidera o ranking de desmatamento. O Acre desmatou 142 km² de floresta apenas em julho deste ano, um aumento de 60% em comparação ao mesmo mês de 2023.
Um patrimônio ameaçado
Além dos impactos nas áreas urbanas, as queimadas também atingem áreas de conservação de grande importância ecológica no estado. No início de setembro, o Parque Nacional da Serra do Divisor, localizado no interior do Acre, sofre com um incêndio de grandes proporções.
A área, reconhecida por sua biodiversidade única, já teve cerca de 10 hectares de floresta atingidos pelas chamas. Uma verdadeira força-tarefa envolvendo o Corpo de Bombeiros, o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e população local está empenhada no combate ao incêndio.
A GAZETA DO ACRE